sexta-feira, 4 de junho de 2010

Eu sei, Teddy

Eu sei que não faz sentido nenhum culpar o palhaço por ter me feito rir e ter me encantado, nem o domador de leões por ser o dono do circo, nem o mundo por girar em minúsculas 24 horas e fazer passar os dias, e os dias completarem um mês, e o mês levar o palhaço para a próxima cidade. Tá Teddy, eu sei que tô derretendo meu rímel todo, e que minha bochecha já passou do vermelho, mas pára de pedir pra eu parar de chorar. Pára de dizer que você sabe o quanto tá doendo agora, mas vai passar. Sabe nada, Teddy. Vai passar nunca. Você não faz idéia do quanto dói acordar cedo todos os dias - sábados e feriados, as vezes -, e ter que passar pela pracinha da minha rua. Enorme. Gigante de tão triste. E cada dia parece que a pracinha aumenta, desde que todas as cores, sons de riso e cheiro de açúcar mudaram, junto com o circo e com meu palhaço, pra outra cidade.
Não, Teddy. Vai passar não.. Você fala assim porque eu nao levei você comigo, e você não viu. Sexta, depois sábado e depois domingo. Final de semana, depois o outro. Não viu como eu tava linda de feliz, toda noite trocava meus ingressos por um sorriso + um saquinho de pipoca. Voltava pra casa andando em algodão doce, considerava o preço, e chegava à conclusão de que saía sempre no lucro. Na primeira vez que ele roubou uma maçã do amor pra mim, e eu fiquei com tanto medo da moça ver e brigar comigo, que tava bem frio, mas minha bochecha até esquentou de tão vermelha. E quando ele me viu, ficou me olhando com uns olhos enormes, e riu fácil, como se tivesse escutado uma piada. E depois me colocou o nariz dele, e a gente ficou rindo de como eu, sem maquiagem, parecia muito mais palhaça do que ele.
Na última vez eu não quis maçã, não quis flor e não quis beijo de tinta. Tava com raiva. Faz sentido não, eu sei Teddy. Não posso dizer que não sabia, que ninguém avisou. Você, inclusive, avisou. Mas tava com muita raiva. Dele, de você, de mim até. E ele insistiu, viu. Mas não passava. Tentou esquentar meu nariz, gelar minhas bochecas, tentou me prender pelos cotovelos pra ouvir o final das piadas dele. Tirou até o girassol do bolso e colocou no meu cabelo. Mas nada deu certo. Eu não ri nenhuma vez depois do espetáculo.
Nem vou rir agora tá, Teddy. Me deixa, vai.